Mais um inimigo – o Idadismo
O idadismo não é um termo tão conhecido quanto o machismo, o racismo ou a homofobia. Porém, é um preconceito bastante presente na sociedade e, assim como todas as formas de discrimização, precisa ser combatido.
Especialmente no mercado de trabalho, mas também na vivência social como um todo, essetipo de intolerância aparece cada vez mais.
A experiência parece ter ficado em segundo plano, deixando de ser um critério de qualificação profissional imprescindível, sendo substituída por outros valores, que são igualmente importantes, como criatividade e inovação, por exemplo. É como se, pelo fato de a pessoa ser mais velha, ela perdesse a capacidade de aprender, se reinventar e se atualizar.
Mas não são somente os idosos que sofrem com esse tipo de preconceito. Os mais novos, vez ou outra, também acabam sendo vítimas.
O que é idadismo?
O que é idadismo?
O idadismo é uma forma de preconceito sofrida por pessoas por conta da idade, sobretudo em relação aos indivíduos mais velhos. O termo é uma tradução literal da expressão inglesa ageism, que significa prática discriminatória com base na idade.
A discriminação etária pode ocorrer nos variados setores da sociedade e causar os mais diferentes tipos de consequências entre os indivíduos que são vítimas dessa intolerância, como o isolamento social.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o idadismo tem três dimensões: estereótipo (pensamentos), preconceito (sentimentos) e discriminação (ações e comportamentos).
Ainda de acordo com a entidade, em seu estudo Global Report on Ageism, o idadismo apresenta três níveis de manifestação (institucional, interpessoal e autodirigido) e conta com dois tipos de representação: explícita (consciente) e implícita (inconsciente).
O termo “idadismo” é relativamente novo e, ao que tudo indica, foi usado pela primeira vez em 1969 pelo psicólogo norte-americano Robert N. Butler. Na ocasião, o conceito foi criado para tentar explicar as opiniões contrárias à construção de uma habitação para idosos em uma comunidade local.
Butler não via nenhum motivo racional para que os moradores vissem com maus olhos o novo empreendimento. Afinal, os futuros vizinhos não apresentariam nenhum tipo de ameaça ao convívio social. Foi então que o psicólogo concluiu que a única razão para o descontentamento da vizinhança seria a idade dos novos inquilinos.
Na interpretação de Butler, os residentes do bairro acreditavam que, ao contar com esse tipo de imóvel na região, haveria uma desvalorização da área.
A partir daí, o conceito de idadismo passou a ser usado em diversos outros contextose países para designar qualquer tipo de preconceito relacionado à idade, seja aos jovens, seja aos idosos.
Por aqui, o idadismo se manifesta, sobretudo, em duas esferas muito importantes: a profissional e a pessoal. Tanto no mercado de trabalho quanto na vivência social é possível encontrar posicionamentos que reforçam a discriminação etária, como destacamos a seguir.
É comum ver ótimos profissionais discriminados em vagas totalmente indicadas para os seus perfis por conta da idade -– ou por ser jovem demais ou experiente em demasia. No caso da falta de experiência, normalmente, se argumenta que se trata de um cargo que exige muitas responsabilidades e competências que só são conquistadas com o tempo.
Já no segundo exemplo, é dito justamente o contrário: que a vaga pede um funcionário mais disposto a aprender, sem vícios e que seja capaz de executar múltiplas tarefas. Aqui, também é comum usar o conhecimento tecnológico como desculpa.
Questões geracionais, como “um baby boomer não se encaixa no perfil, precisamos de um nativo digital”, acabam entrando na pauta. Outro fator que merece destaque no idadismo aplicado ao mercado de trabalho é o tópico salarial.
Muitas vezes, idosos são preteridos em vagasporque as suas experiências custam mais caro do que as de um novato que está começando. A questão não é que a carreira não deva ser valorizada. Ela deve, mas não pode servir de desculpa para a não contratação de um profissional capacitado.
Para finalizar, a última representação da prática discriminatória por conta da idade se dá ao respeito ou não da opinião alheia. Não raro, pessoas mais jovens são silenciadas ou têm os seus pontos de vista relegados a um segundo plano por causa da sua falta de experiência.
Na vivência social, também é possível ver práticas de idadismo, muitas vezes, influenciadas por estereótipos criados. A visão de que o idoso é um ser frágil, que necessita de cuidados, por exemplo, nem sempre é uma atitude positiva, pois pode gerar dependência.
Mesmo que feito com as melhores das intenções, por familiares amorosos, essa prática pode ser prejudicial. O ideal é tentar manter certo nível de liberdade para o idoso, deixando que ele possua a sua própria rotina, até quando isso for possível.
Habitação, tecnologia, finanças e educação são áreas em que existem estudos que evidenciam a discriminação etária. Um levantamento japonês mostrou que é mais complicado para os idosos conseguirem ter um imóvel depois de uma certa idade, devido aos contratos discriminatórios.
O principal temor está relacionado às brigas com outros inquilinos por conta do excesso de barulho e aos problemas de segurança, como a maior possibilidade de incêndios, por exemplo.
Por falar em segurança, essa pesquisa aponta que a falta de acessibilidade para idosos em habitações também é uma representação de idadismo.
Quanto à tecnologia, os estereótipos são ainda mais claros. Os idosos são vistos como pessoas que não conseguem se adaptar aos lançamentos tecnológicos e não são consultados na criação de novos designs ou ferramentas.
Já quanto aos produtos financeiros, se você é idoso no Brasil, ou em boa parte dos outros países do mundo, vai ter muita dificuldade de ter acesso aos serviços de crédito. Porque a idade é um fator de risco no cálculo de seguros, por exemplo. A margem para empréstimos e financiamentos também é menor se você já tiver cabelos brancos.
Uma prova disso vem do relatório do United Kingdom’s Financial Conduct Authority, que apontou que pessoas mais velhas tendem a ser vítimas de discriminação ao contratar serviços financeiros por conta da idade.
Retomar os estudos ou ingressar no ensino superior também é mais difícil para quem é mais velho. Seja pela falta de incentivo, seja pelo próprio idadismo autodirigido , a verdade é que o número de indivíduos que investem na educação depois de uma certa idade é baixo.
No entanto, tudo começa com o chamadoidadismo autodirigido, que nada mais é que os sofredores do preconceito aceitarem os estereótipos a eles dirigidos. Por exemplo, uma pessoa de 20 e poucos anos que acha que é muito nova para determinada vaga e decide não se candidatar. Ou um indivíduo de 60 anos que se acha velho demais para aprender novas habilidades e desiste de prestar vestibular.
O sentimento de exclusão, aliado às mudanças naturais na rotina provocadas pela chegada da idade, afetam negativamente as perspectivas de vida de pessoas mais idosas.
Julgamentos de todos os tipos e o excesso de cuidado levam quem tem mais de 60 anos a perder ainda mais a autonomia com o passar do tempo
(publicado no site da FIA -– Fundação Instituto de Administração).